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sábado, 25 de abril de 2009

35 anos depois

35 anos depois



O investimento no saber, na escola, no exercício dos direitos de cidadania, no culto da tolerância, da compreensão da diversidade, na cultura crítica perante as verdades tão absolutas quanto efémeras.


Trinta e cinco anos depois ainda não estamos de acordo sobre a importância que o 25 de Abril teve nas nossas vidas. Basta ler os textos que ritualisticamente se publicam por altura da efeméride. Desde as evocações iluminadas, como se uma glória absoluta transbordasse desse dia, à persistente denúncia das memórias negras do regime derrubado. Tudo isto misturado com o queixume dos vencidos e embrulhado nas diferentes apropriações que cada um, que cada segmento social e político faz da revolução que, então, modificou as nossas vidas.

É verdade que a História é feita pelos vencedores e a proximidade, ainda tão emotiva, dessa data contribui para que cada um, de alguma forma, usurpe à sua maneira a finalidade última dessa vitória sem vencidos. Paradoxalmente esta usurpação, este lado onde todos se encontram de forma difusa, inconsequente, saudosista, mais fundada na rememoração de emoções do que da divulgação dos valores essenciais que de Abril nasceram, é a primeira causa do desvanecimento da curiosidade dos mais jovens, daqueles que não viveram, que não tem condições para recordar, que estão impossibilitados de assumir um testemunho e uma posição sobre o dia que não conheceram.

Actualmente, mais de metade da população do país nasceu depois do 25 de Abril ou era de tenra idade quando passou o ano de 1974. Daqui por dez anos, mais de dois terços da população viverão a mesma condição. Que teremos nós para lhes dizer hoje? E daqui por dez anos? Como explicaremos a herança democrática que dia após dia vamos construindo, enquanto caminhada iniciada nesse dia?

Sendo certo que testemunhamos, e vivemos, uma degradação permanente dos mitos fundadores, alicerçados na Liberdade, na Igualdade e na Fraternidade, como se em 74 tivessem renascido as utopias geradas duzentos anos antes pela Revolução Francesa, estou em crer que celebrar o 25 de Abril só terá um significado historicista se lhe entregarmos um destino, se lhe colocarmos objectivos comuns a todos os vencedores. O investimento no saber, na escola, no exercício dos direitos de cidadania, no culto da tolerância, da compreensão da diversidade, na cultura crítica perante as verdades tão absolutas quanto efémeras.

Ou atacamos por aqui a necessidade evocativa ou, então, daqui por mais vinte anos, será esta data mais um feriado banal, como se banalizaram outros dias decisivos da história do nosso País. É que António Gedeão tinha razão. O ‘mundo pula e avança/ como bola colorida entre as mãos de uma criança’. Só que, de há vinte anos a esta parte, graças à revolução cibernética, pula e avança a um ritmo que nenhum dos vencedores do 25 de Abril supunha. Acelerámos o tempo, acelerámos o ritmo da vida individual e colectiva a um limite que falta tempo. Para a reflexão, para a comunhão dos afectos. Para cumprir o lado da História que vive no Abril que falta cumprir.Depois de tanto caminho andado, será que resta tempo para o caminho que ainda não cumprimos? Não sei. Daqui por cinquenta anos, os historiadores o dirão. Libertos de paixões. E habitando o tempo dos sábios. O tempo que nos escapa por entre os dedos das mãos.


Francisco Moita Flores

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