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Era o Ano Internacional da Criança. Os anos acabados em 9 são anos de esperança. Esperança rima com criança. Nesse longínquo ano de 1979, todas as crianças já tinham nascido depois de o homem ir à lua, o que ocorrera dez anos antes.
Depois de uma viagem ao interior da Guiné-Bissau, agravaram-se as minhas dúvidas quanto à história de Pandora: esta, como é sabido, violou as recomendações para não abrir a sua caixa, espalhando o mal pelo mundo; no entanto, ao voltar a fechar a caixa, para tentar remediar o irremediável, ainda teria conseguido conservar uma virtude, precisamente a esperança.
Duvido que muitas coisas tenham melhorado, entre essa geração e a actual, nas três décadas que separam pai e filho. Pensando bem: de que serve ir à lua, todos os avanços tecnológicos dos últimos tempos? Nos países «desenvolvidos» grassa uma crise sem precedentes, ameaçando o próprio sistema. Não é uma crise clássica de «superprodução», é pior: é uma crise do desperdício de valor, da capacidade não utilizada, do desemprego, da desvalorização do homem, como criador de valor e como consumidor responsável.
Com tanta capacidade de produção, é o problema da solvabilidade da maior parte da população mundial que se coloca: as necessidades são imensas; com a novidade de franjas cada vez maiores de população, nos países «desenvolvidos», também se verem marginalizadas e desvalorizadas. Impossível continuar a enganar o sistema com «crédito ao consumo»; este é um problema estrutural, que já Ford previra, afirmando que era necessário «dar» dinheiro às pessoas para lhes conseguir vender os produtos... ele próprio dando o exemplo e pagando várias vezes o salário médio aos seus empregados.
Há pois que repensar os conceitos de dinheiro e de valor: comprei, numa viagem recente à Guiné-Bissau, um banquinho «portátil» (tem uma pega), em madeira maçiça, talhado à catana, pelo preço de um café em Portugal. No entanto, o produto manufacturado estava perfeitamente equilibrado (e foi-me de grande utilidade no aeroporto, enquanto esperava o embarque): era um presente e a pessoa a quem se destinava adorou e fez-lhe uma grande festa.
O problema reside em o valor ser reconhecido apenas pelo dinheiro, porque todos temos algo a oferecer à sociedade, todos conseguimos tornar-nos de alguma utilidade: mas haverá dinheiro para nos pagar? Será que as crianças daqui a outros 30 anos terão maiores razões de esperança?
«A esperança é a última a morrer»! Vivam as crianças!
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