| O xadrezista Francisco Carapinha, ao serviço da
Selecção de Xadrez de Cabo Verde, empatou com Tunç Hamarat, o 16.º
Campeão Mundial de Xadrez por Correspondência, num jogo a contar para
fase preliminar da 20.ª Olimpíada de Xadrez por Correspondência. |
Em Portugal jogou xadrez no Centro Desportivo e Juvenil de Ulme e no Grupo de Xadrez de Santarém, colectividades que já foram extintas. Mas foi daí que levou os ensinamentos da modalidade que lhe permitiram chegar a capitão da selecção de Cabo Verde e a disputar vários torneios internacionais, onde se bateu com alguns dos melhores xadrezistas mundiais, como é o caso do campeão turco Tunç Hamarat.
Francisco Carapinha é um autodidacta, iniciou a sua caminhada no xadrez de uma forma insólita. No dia em que fez 12 anos ofereceram-lhe um perfume que trazia como oferta um mini-jogo de xadrez e também uma pequena resenha das regras do jogo. “Na altura estudava na Escola Eng. Belard da Fonseca, hoje Escola Secundária da Chamusca, interessei-me pela modalidade e comecei a tentar entrar no jogo através dessa resenha. A Revolução do 25 de Abril de 1974 tinha sido há pouco tempo e o desporto estava em marcha acelerada e eu entrei na onda”, disse.
Através da então Direcção Geral dos Desportos (DGD) fundou a Secção de Xadrez do Centro Desportivo e Juvenil de Ulme. “Depois a convite da DGD participei numa simultânea realizada na Feira Nacional da Agricultura em que joguei com um dos mestres internacionais portugueses da altura, o Joaquim Durão. A partir daí já não parei, participei em várias competições regionais e nacionais, e organizaei vários torneios de xadrez em Ulme, principalmente na altura das festas populares”, avança Francisco Carapinha.
Enquanto estudou na Escola da Chamusca, Francisco Carapinha foi jogando em Ulme e lendo tudo o que conseguia sobre a modalidade. Mais tarde foi estudar para Santarém e foi aí que desenvolveu mais a sua vocação para o xadrez. “Passei a jogar pelo Grupo de Xadrez de Santarém, onde se encontravam alguns dos melhores jogadores de xadrez da região. Logo no início fui vice-campeão distrital de juvenis. Hoje aqui em Cabo Verde recordo alguns amigos, que jogam agora na Casa de Xadrez de Alpiarça”, disse.
Foram bons tempos para o xadrez em Portugal e Francisco Carapinha conseguiu criar três núcleos no concelho da Chamusca, em Ulme, Carregueira e Vale de Cavalos. Depois de terminar os estudos, Francisco Carapinha foi trabalhar para a Câmara Municipal de Coruche, como animador sócio-cultural e desportivo. “Aí fui o responsável pela implementação da modalidade naquele concelho, chegando a ter cerca de 2.000 miúdos a participar e a aprender a jogar, consegui mesmo levar para Coruche a sede da Associação de Xadrez de Santarém”.
“Saí de Portugal com 39 anos, tinha uma namorada cabo verdeana, com quem acabei por casar e em 2001 acabei por apostar tudo em Cabo Verde. Durante alguns anos parei com a modalidade, mas depois de arrumada a casa, voltei em força. Em 2008 organizei um Festival de Xadrez trazendo cá o então campeão de Portugal, que já não via há muitos anos. Na altura era vice-presidente da Associação de Xadrez de S. Vicente (ilha onde vivo), e o evento serviu para o despertar do xadrez em Cabo Verde. Foi um grande marco e um ponto de viragem do xadrez crioulo. Um ano depois fui eleito presidente da referida Associação, cargo que continuo a exercer. Em 2010 consegui que Cabo.
Verde fosse aceite como membro afiliado (sem voto no congresso e sem poder participar nas Olimpíadas de xadrez na ICCF - International Correspondence Chess Federation. Fruto da minha insistência, consegui que a Selecção de Cabo Verde participasse nas 20.as Olimpíadas de Xadrez por Correspondência e que este ano fosse aceite como membro de pleno direito. Por decisão dos restantes elementos directivos, tenho sido o capitão de todas as selecções de Cabo Verde de Xadrez e por convite do director da Zona 4 da ICCF sou o capitão de uma selecção da África/Ásia que está a disputar o 7.º interzonal (uma espécie de taça das confederações)”, refere Francisco Carapinha com entusiasmo.
O empate com o campeão do mundo foi sem dúvida o ponto mais alto da carreira de Francisco Carapinha no xadrez. “Não só pela vertente pessoal como o que pode representar para Cabo Verde. Um país tão pequeno e pobre conseguir que um jogador ao serviço de uma sua selecção empate com um campeão do mundo é formidável”, diz com redobrado entusiasmo.
A mãe continua a viver em Ulme e o irmão no Entroncamento
A família de Francisco Carapinha continua a viver em Portugal, a mãe vive em Ulme, “onde sempre viveu”, e a irmã vive no Entroncamento. Mas o contabilista de profissão, tem muita família chegada na Chamusca, e não consegue fugir às suas raízes. “Sou contabilista inscrito nas Ordens de Cabo Verde e Portugal e sou sócio maioritário da empresa Pinéu - Comércio e Serviços, Lda. Tenho orgulho em ser pinéu (nome porque são designados os naturais de Ulme)”.
Embora considere que vai ser difícil regressar definitivamente, Francisco Carapinha vem frequentemente a Portugal, tanto em lazer como quando lhe junta a oportunidade de jogar. “Estive em Ulme e na Chamusca o Verão passado só por lazer e há um ano atrás além do lazer estive também a participar num torneio em Fornos de Algodres. Regressar a Portugal definitivamente é difícil, pois tenho a vida organizada e estabilizada em Cabo Verde. Os meus negócios e interesses estão aqui, no entanto nunca digo que “desta água não beberei”.
Para quando a homenagem a Manuel Martinho Lopes
Em Portugal, além do CDJ Ulme e do G. X. Santarém, Francisco Carapinha jogou no Ávila Atlético Clube, no Grupo de Xadrez de Coruche, no Grupo Desportivo Diana de Évora (onde em 2010 foi um dos jogadores que participou na campanha que levou à conquista da Taça de Portugal) e na Associação Académica de Coimbra.
Mas a sua primeira memória da modalidade no distrito de Santarém, chama-se Manuel Martinho Lopes. “Por certo o melhor jogador do distrito de todos os tempos. Com a alcunha do “Barba Negra”, era o terror dos tabuleiros e um artista. Estar com ele era a certeza de momentos de boa disposição com as hilariantes histórias que contava. Colaborou muitas vezes comigo indo fazer, gratuitamente, simultâneas a Ulme. Foi meu adversário e meu colega no Grupo de Xadrez de Santarém e mais tarde no Grupo de Xadrez de Coruche quando também trabalhou na câmara daquela vila. Infelizmente está com uma doença que não lhe permite jogar”, lamenta Francisco Carapinha.
“O distrito de Santarém, pelo que ele fez no xadrez, deve-lhe uma homenagem. Um torneio nacional organizado no distrito e denominado “Martinho Lopes”, talvez fosse um bom princípio. Até eu iria, propositadamente se necessário, aqui de Cabo Verde para jogar esse torneio e tenho quase a certeza que os melhores jogadores nacionais lá estariam”, garante o xadrezista.
in Jornal O Mirante
Edição de 2013-12-19
Edição de 2013-12-19
Sem comentários:
Enviar um comentário