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domingo, 13 de julho de 2008

Crónicas sobre xadrez - número 8

A intermediação pelo arquétipo...

Para além da questão da determinação da origem do xadrez, interessa reflectir nas razões que o levaram a tornar-se no jogo mais internacionalizado depois do futebol: depois da FIFA, é a FIDE. Se o fenómeno do futebol é recente (não tem mais de cem anos de história), já a adopção do jogo de xadrez pelos mais variados povos vem de muito mais longe...

Como explicar esta extraordinária universalização antes de haver medias ? Na Idade Média, antes que os portugueses chegassem à India, já o jogo se jogava em todo o hemisfério Norte, de Portugal ao Japão ! À sua chegada à India, muitas coisas terão surpreendido Vasco da Gama, e antes dele Pero da Covilhã, que já lá havia estado por conta de El-Rei D. João o Segundo, como por exemplo a parecença entre o culto indígena e o cristão.

Nessa altura, o espírito estava ainda aberto à parecença na diferença, ao respeito pelo «Outro», Rei do Congo ou qualquer outro. Ideia que depressa esmoreceu sob o peso da corrupção gerado pelos «fumos» das especiarias e pelo poder fraco de D. Manuel e seu filho D. João, o Pioso. Pioso em demasia, levou à entrada da Inquisição no nosso país, o que viria a iludir o esforço de tolerância que houvera caracterizado os primeiros tempos dos descobrimentos. Abandonou-se o espírito inicial, de «religação do mundo», para ensaiarmos a perigosa via da anulação do «Outro», detentor de sua própria e inassimilável identidade e cultura. Perdeu-se assim o esforço de miscigenação do obreiro do Império: Afonso de Albuquerque, que fez dos portugueses mediadores. A ideia, que já lhe vinha da altura em que era capitão da guarda do Príncipe Perfeito, era fazer dos portugueses não apenas mediadores comerciais, agarrados ao ganho efémero, mas sim mediadores culturais que pudessem fazer uma proveitosa síntese entre a sua própria e essas culturas distantes, baseando-se nos seus pontos comuns, que os havia, tal o xadrez.

Mas começou a perseguir-se a diferença na parecença e tudo foi de mal a pior, com mútuas desconfianças. A primeira geração de jesuítas ainda tentou essa síntese in extremis (em Cipango), esforço gorado, não fossem os 5% de japoneses cristãos (e perseguidos durante séculos) e a centena de palavras de origem portuguesa em japonês (para saber como se diz Cristo em japonês imagine-se um português soletrando com muito cuidado a palavra Kirishito). Voltando ao xadrez para tentar responder à questão da universalidade do jogo. Não será a disseminação do jogo e a própria reivindicação múltipla da sua origem uma prova de que o xadrez pode ser considerado um arquétipo da humanidade ? Desempenhando um papel pedagógico – pretexto para a iniciação dos mais novos nas coisas da guerra – ou mesmo sagrado: na India faziam-se jogos humanos em que os guerreiros «comidos» eram sacrificados e Al Masudi, historiador árabe do século X, afirma que os hindus são capazes de ler o passado e o futuro num jogo de xadrez.

by José Fernando in jornal "O Ribatejo", Maio 1998


P.S.: As crónicas aos domingos vão ser suspensas por um mês devido a férias. Boas férias para todos !

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